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segunda-feira

GOVERNANÇA CORPORATIVA

Em julho deste ano, o engenheiro Meyer Joseph Nigri, presidente executivo e do conselho de administração da Tecnisa, decidiu acumular mais uma função: a de diretor de relações com investidores. A decisão lhe rendeu uma avalanche de críticas de analistas. "Diziam que em meio a tantas atribuições ou eu não fazia nada ou fazia tudo sozinho", afirma Nigri. "E, tanto num caso como no outro, isso não era nada bom." Até fevereiro, quando abriu o capital da empresa na Bovespa, Nigri jamais precisou se preocupar com esse tipo de comentário. Depois do IPO, apesar de ainda controlar a construtora com 58% de seu capital, ele precisou aprender a dividir poder e informação com seus novos sócios na bolsa. O criticado acúmulo de postos, por exemplo, durou apenas dois meses. Em setembro, Nigri indicou um novo diretor de relações com investidores, o paranaense Leonardo Paranaguá, que já trabalhava na área financeira da empresa. Um mês depois, anunciou que também cederia o comando da Tecnisa, a partir de janeiro de 2008, ao executivo Carlos Alberto Júlio, atual presidente da promotora de seminários corporativos HSM no Brasil. "Preciso de alguém para dividir as responsabilidades", diz Nigri. "Não foi apenas uma resposta ao mercado."

Impasses como os vividos pelo dono da Tecnisa começam a aflorar passados os primeiros momentos de euforia com a bolsa brasileira -- e são mais comuns do que se imagina. Um levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) com 366 empresas brasileiras de capital aberto, publicado com exclusividade por EXAME, mostra que a governança dessas companhias ainda tem muitas vulnerabilidades (veja quadro abaixo). Numa escala de zero a 20 pontos, as companhias alcançaram a média de 8,8 neste ano. É uma nota maior do que os 7,9 e 7,7 obtidos, respectivamente, nos dois anos anteriores, porém, ainda inferior à metade do que é considerado ideal pelo instituto. O que derruba o resultado global são práticas resultantes do controle excessivo do dono -- e hoje metade das companhias abertas brasileiras tem controle familiar. "A dificuldade dos empreendedores em abrir mão das decisões criou, historicamente, uma barreira para a participação dos demais acionistas", diz Alexandre di Miceli, pesquisador sênior do IBGC e coordenador técnico do estudo.

Esse poder exagerado dos controladores gera algumas distorções. Uma delas é que apenas 1% das companhias proíbem empréstimos em favor do controlador em seu estatuto (há três anos, nenhuma proibia). A falta de diretrizes claras sobre o assunto gerou incidentes, como o vivido pelos investidores da Gerdau. Em 2002, eles foram pegos de surpresa por um empréstimo de 45,3 milhões de reais concedido pela empresa ao Haras Joter, controlado pelo então presidente do grupo, Jorge Gerdau Johannpeter. Ainda que afirme nunca mais ter praticado operação semelhante, a Gerdau -- listada no nível 1 da Bovespa -- cometeu outro deslize recentemente. Em abril de 2006, a companhia decidiu elevar subitamente a cobrança de royalties pela marca Gerdau, pagos pela empresa à família controladora. De menos de 1 milhão de reais por ano, o valor passou para 16,2 milhões no primeiro trimestre de 2006. Embora não fosse ilegal, a cobrança chamou a atenção de minoritários, como o americano Mark Mobius, especialista em mercados emergentes da gestora de fundos Franklin Templeton Investments, e também da Comissão de Valores Mobiliários. Para evitar polêmica, os controladores voltaram atrás e cederam os direitos da marca à Gerdau.


Prestaçãode contas
Um levantamento do IBGC mostra os avanços e as fragilidades na governança das companhias brasileiras de capital aberto


Avanços:

Hoje, 30% das companhias listadas possuem apenas papéis com direito a voto. Eram 18% há três anos.

72% das empresas abertas já têm pelo menos um quarto de seu capital negociado em bolsa — 5 pontos percentuais a mais do que em 2004.

Passou de 8% para 26% o grupo de empresas que prevêem tag along(1) para ações preferenciais ou maior de 80% para ações ordinárias.

Fragilidades:

Só 4% das empresas revelam a composição do salário pago à diretoria.


O percentual de empresas que divulgam como lidam com conflitos de interesses em investimentos ou relações com fornecedores não chega nem a 1%.


Apenas 1% das companhias proíbem formalmente empréstimos em favor do controlador ou de pessoas e empresas a ele relacionadas


(1) Extensão para todos os acionistas das mesmas condições conseguidas pelos controladores na venda do controle da companhia Base: companhias abertas cujos papéis foram negociados pelo menos uma vez no ano da pesquisa
Fonte: IBGC

O CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO, teoricamente responsável por garantir o interesse de todos os investidores, e não de um ou outro acionista, também não escapa à ingerência dos controladores. No Brasil, 77% das companhias possuem um conselho formado apenas por membros externos -- ou seja, conselheiros que não são funcionários, mas que podem ser parentes, amigos, prestadores de serviço ou manter qualquer outro elo com empregados e executivos da companhia. Na prática, essa composição resulta em casos como o da fabricante de papéis Klabin. Dez das 12 cadeiras do conselho da empresa são ocupadas por descendentes dos Klabin e dos Lafer, primos entre si. Os outros dois assentos pertencem a executivos que fazem parte também do conselho do grupo Monteiro Aranha, que detém um quinto das ações com direito a voto da Klabin. Ainda que não trabalhem na empresa, todos os conselheiros têm interesses diretos na gestão. E nada garante que sejam os mesmos dos donos dos 48% do capital da companhia que está na bolsa. (Procurada por EXAME, a Klabin afirmou apenas que atende a todos os requisitos do nível 1.) "As empresas brasileiras que mantêm conselhos dominados por membros independentes são raridade", diz Miceli. Trata-se de uma realidade diferente da encontrada em países como os Estados Unidos. Segundo dados do IBGC, os conselhos americanos possuem em média 12 membros, dos quais 11 são independentes.

AINDA SÃO POUCAS AS EMPRESAS que realmente distribuem o poder entre os acionistas, com ações que possuem o mesmo peso de voto. Grande parte das ações que estão na bolsa represen ta papéis preferenciais, sem direito a voto. Em seis de cada dez companhias listadas na Bovespa, a porcentagem de ações sem voto é maior do que 20% do capital, fenômeno atrelado sobretudo à resistência de grupos familiares em permitir que as ordens também venham de acionistas de fora do clã. O Novo Mercado avançou, mas ainda representa apenas 20% das empresas listadas. (Entre as demais, 14% estão nos níveis 1 e 2 de governança e 66% no mercado tradicional.) A centenária seguradora SulAmérica, da família Larragoiti, abriu capital em outubro no nível 2 da Bovespa. Quase 33% de suas ações foram lançadas na bolsa -- dois terços delas sem direito a voto. "Os papéis sem voto foram um recurso da administração para que a companhia pudesse aproveitar ao máximo a experiência dos controladores", diz Patrick de Larragoiti Lucas, presidente da SulAmérica e representante da quinta geração da família. "Os minoritários são muito importantes, mas os controladores têm a visão para o crescimento da empresa." Assumir a disposição de não participar do Novo Mercado é melhor do que mudar as regras do jogo no meio do caminho. Foi o que aconteceu com o grupo usineiro Cosan. Em junho, o controlador Rubens Ometto anunciou uma reestruturação em que a Cosan deixaria de operar no Novo Mercado da Bovespa. Os 15 000 acionistas individuais e institucionais do grupo tiveram a opção de trocar suas participações por ações de uma nova empresa, a Cosan Limited, baseada nas Bermudas e registrada na bolsa de Nova York. O controlador ficou com ações que dão direito a dez votos, o que garante a Ometto e seus familiares 49% do capital e 90% do total de votos da Cosan Limited. A chiadeira do mercado foi tanta que, pouco mais de um mês depois do anúncio, a administração decidiu estender o benefício aos acionistas minoritários, criando uma nova classe de ações, a B2. Tanto as B2 quanto as B, detidas por Ometto, perdem o poder de fogo se vendidas, e passam a valer apenas um voto (veja reportagem sobre a empresa na pág. 81).

"O mercado é imperfeito, você não consegue impedir que as partes tentem tirar alguma vantagem", diz Luiz Leonardo Cantidiano, um dos pais do modelo do Novo Mercado. Ainda assim, o advogado acredita que as companhias já evoluíram em questões importantes, como a concessão do tag along, benefício que estende aos minoritários as condições conseguidas pelo controlador no caso de venda do controle. A porcentagem de empresas que garantem esse direito subiu de 8% em 2004 para os atuais 26%. Os avanços podem ser ainda maiores pela pressão de autoridades do mercado. A CVM estuda uma nova forma de divulgação de informações relevantes pelas empresas, como a da remuneração de diretoria e conselho, hoje informada apenas em bloco. Somente 4% das empresas publicam quanto pagam a cada um de seus executivos e quais os indicadores atrelados à remuneração variável. Nos Estados Unidos, todas as companhias são obrigadas a abrir esses números. "A divulgação é fundamental para que os acionistas saibam qual a ligação dos executivos com a empresa", diz José Carlos Grubisich, presidente da petroquímica Braskem, empresa que divulgou um pagamento de 18,9 milhões de reais à diretoria e de 1,7 milhão de reais ao conselho em 2007. "A transparência é sempre o melhor caminho."

Fonte: Portal Exame

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